domingo, 30 de junho de 2013

Razões Psicossociais dos Movimentos nas Ruas

Foto: SEMILIA_LUZ/FLICKR, disponível originalmente em PACIFIC STANDARD.
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RAZÕES PSICOSSOCIAIS DOS MOVIMENTOS NAS RUAS
Jaqueline Gomes de Jesus
Doutora em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações pela Universidade de Brasília.
Dois princípios básicos no entendimento da capacidade de mobilização de público para um determinado evento (no caso os protestos que vêm eclodindo Brasil afora), no sentido psicossocial e não apenas político, referem-se à fonte de informação sobre o que se pretende realizar e à efetividade dos mecanismo de estímulo à participação. Sabe-se que as mobilizações que testemunhamos — e das quais alguns de nós também participam — foram planejadas a partir de mídias sociais com base na internet, em especial o Facebook, mais utilizado no país do que outros disponíveis.
As informações postadas nesse canal foram curtidas e compartilhadas — utilizando aqui a linguagem do próprio recurso eletrônico — por meio de redes sociais (amigos repassando a notícia para amigos e “amigos de amigos”), com reprodução potencialmente estrondosa, tendo em vista que apenas o programa citado tem mais de meio milhão de usuários em todo o mundo, e que os interessados também se utilizam de outros recursos para difusão da notícia, como microblogs, blogs e sites pessoais ou de coletivos.
Uma questão precisa ser posta neste momento: por que um número substancial de pessoas considerou que o dado sobre uma manifestação contra o aumento das tarifas de ônibus — tema inicial dos protestos — era significativo ao ponto de repassarem a informação a outras pessoas, e dele participarem presencialmente, não apenas como frequentadores do evento virtual?
A importância da mensagem é um fator crucial pra se chegar a uma resposta plausível. Até que ponto o aumento do preço da passagem era visto prejudicial por essa parcela da população? A possibilidade de redução da tarifa era tido como benéfica? Evidentemente, relembrando a presença massiva de pessoas nas ruas, elas se preocuparam intensamente com o assunto, e reconheceram, naquele momento de subversão da rotina das maiorias silenciosas, uma oportunidade para serem vistas, ouvidas e, quiçá, atendidas.
Se a internet facilitou o contato entre as pessoas e aumentou a velocidade da troca de informações, aquele momento em particular de visibilidade global do Brasil — decorrente da realização da Copa das Confederações — preparou um terreno propício para que as demandas e reclames se tornassem visíveis.
Ser visível não é apenas “aparecer” (a causa não é apenas “causar”, como dizem alguns), é ser visto(a) como alguém que se destaca de uma multidão amorfa, mesmo que passe a fazer parte de outra multidão, a engajada.
Ser parte dessa massa com uma ou várias causas corresponde a adquirir uma identidade social com um grande grupo, com o qual se solidariza e que é valorizado por ser atuante, enfrentando o que se considera injusto.
O sucesso da primeira mobilização, amplamente noticiada (apesar do tratamento instintivamente estereotipado que em geral os meios de comunicação tradicionais deram aos manifestantes), foi o sinal de que “valia a pena reclamar”, o que abalou a paralisia devida à descrença nas estruturas políticas e estimulou a que fossem levados às ruas outros temas sociais.
O “vem pra rua” subsequente foi um chamado para a reunião de atores socais no maior palco do Brasil. Uma energia acumulada posta em movimento, reverberando em enfrentamento às críticas simplificadores, à repressão policial e ao silêncio das autoridades, com resultados positivos em termos políticos para a democracia brasileira, mas igualmente com efeitos que podemos chamar de “colaterais”, porque inerentes à tamanha explosão de cidadania em curto espaço de tempo: destruição do patrimônio público e privado, agressões e progressiva tentativa de apropriação das multidões mobilizadas, e de seus discursos, por grupos com bandeiras ideológicas e partidárias bem definidas.
A mensagem das ruas foi enviada e recebida. Como ela será elaborada e respondida, é o que agora estamos observando. Qualquer especulação sobre os rumos destes protestos difusos que generalize suas pautas, sem considerar questões regionais e a repercussão das ações governamentais imediatas em atender suas demandas, será precipitada e superficial.
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